domingo, 18 de maio de 2014

Azul (também é) cor de Direito



''A água é o princípio de todas as coisas.'' 

Tales de Mileto

 
No seguimento da conferência 'Direito Humano à Água no quadro dos objectivos da ONU de desenvolvimento sustentável pós-2015'' que, teve lugar no dia 28 de Março de 2014, na nossa faculdade, foram várias as questões suscitadas.
É objectivo do presente trabalho 'lançar mão' de algumas das questões deixadas 'em cima da mesa',  dar a conhecê-las e reflecti-las.

O século XXI e o estilo de vida adoptado juntamente com o aumento da população mundial colocam os recursos ambientais essenciais em pressão. Falo da água, do ar, do solo, da fauna e flora. É possível e em que medida, suportar um quadro de equilíbrio entre crescimento económico, danos ambientais e escassez de recursos? Sem prejuízo dos progressos que se verificam nas últimas décadas, designadamente na energia, transportes, protecção da biodiversidade, poluição enfim, uma preocupação ecológica notória pode, ainda assim, não ser suficiente para assegurar recursos naturais num futuro, não muito longínquo.
No início, o problema da água era visto como um problema económico. A água era um meio para navegação e comércio e, o interesse sobre aquela era meramente financeiro. Havia já, uma preocupação mas, de cariz económico e não uma preocupação ecológica. Nos anos 60 do século XX, preocupações ecológicas começam a despoletar-se. Por conseguinte, essa preocupação (tardia) pela água leva a que, nos dias de hoje, sendo a água um recurso escasso, escassez essa de quantidade e qualidade, se afiguram problemas de uma intensa gravidade. Sobretudo em determinadas zonas do globo tendencialmente, as zonas menos desenvolvidas e mais pobres, às quais ao longo dos anos se foram retirando recursos naturais e financeiros à custa de interesses económicos de outros países.

Direito à Água - Temas abordados:

         Água, enquanto Direito humano à água: questões fundamentais; 
         Direito à água e outros direitos e deveres fundamentais;
         Direito fundamental à água como concretização do direito fundamental ao ambiente; 
         A eliminação progressiva das desigualdades na agenda de desenvolvimento pós- 2015: o exemplo do direito humano à água e saneamento; 
         A efetivação do direito humano à água no plano nacional e internacional;
         Mecanismos internacionais de concretização do direito à água;
         Direito à água no centro dos direitos humanos; 
         Direito à água e os direitos à saúde e à alimentação; 
         Direito à água e a proteção do ambiente; 
         Direito à água e a igualdade no acesso aos serviços públicos; 
         Água e alterações climáticas;
         Água e desenvolvimento urbano;

 
Esta imensa panóplia de temas infirmam as várias ordens de problemas que se suscitam. Cumpre, ad initio efectuar uma primeira distinção, de modo a ser possível enquadrar a temática abordada.

Água,
Enquanto Direito humano à água - avoca questões fundamentais; Direito à água e outros direitos e deveres fundamentais (Consagração 2010 do direito à água enquanto direito humano, referido na Intervenção da Professora Carla Amado Gomes);

Enquanto Direito dos recursos hídricos, Direito dos serviços de águas - visam, simultaneamente cumprir dois fins: proteger os recursos e os sistemas hídricos e assegurar os usos da água pelos seres humanos.

Embora interligados a própria legislação inculta esta distinção. De destacar:
  • Lei da Água, Lei n.º 58/2005 de 29 de Dezembro - transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva n.o 2000/60/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Outubro, estabelecendo as bases e o quadro institucional para a gestão sustentável das águas. O artigo 5º - ”determina que “constitui atribuição do Estado promover a gestão das águas e prosseguir as atividades necessárias à aplicação da presente lei”. 
  • Lei recursos Hidricos, Lei n.º 54/2005 de 15 de Novembro - Estabelece a titularidade dos recursos hídricos
  • Decretos-Leis n.º 45/94, 46/94 e 47/94, de 22 de Fevereiro -  Definem, respectivamente o processo de planeamento dos recursos hídricos, o regime de licenciamento das utilizações do domínio hídrico e o regime económico e financeiro das utilizações do domínio público hídrico.
  • Lei n.o 19/2014 de 14 de abril (ultima redacção) - Define as bases da política de ambiente;Relativas a cada um dos componentes ambientais, conforme o art.10, designadamente o ar, a luz, a água, o solo vivo e o subsolo, a flora, a fauna. É na alínea b) desse mesmo artigo que a água enquanto recurso hídrico é enquadrada.
  • Lei Fundamental. Pese embora não consagre expressamente um Direito à Água, implicitamente o faz, segundo a posição da maioria dos autores TaL ideia retira-se da intervenção de Prof. Doutor Rui Guerra da Fonseca na, já referida, Conferência ‘’O direito e o dever de abastecimento de água’’ constitui incumbência prioritária do Estado Português, prevista no artigo 81º da Constituição da República Portuguesa
De entre as várias questões versadas na conferência foi mencionada uma questão curiosa. O ‘caso Irlandês’, caso único na OCDE. Aí, o consumo da água era gratuíto.  Porém, por força do programa de austeridade (2009) foi introduzido um sistema de pagamento.

‘’As medidas de austeridade impostas à Irlanda, sob os termos do pacote de resgate financeiro da UE / FMI 2009, incluem a introdução de cobrança de água e saneamento serviços domésticos. Tal levou à criação de uma nova empresa nacional de água, a qual planeia lançar um programa nacional para a instalação de medidores de água domésticos. A introdução de um sistema de tarifação levanta uma série de perguntas, ainda, não respondidas. Por exemplo, o uso de redes de segurança social para aqueles que não podem pagar, as salvaguardas em relação a desconexão ou redução do serviço em caso de não pagamento, o prestação de contas do novo utilitário por qualquer falha no fornecimento de água adequada e, modalidades de participação pública significativa na tomada de decisões sobre os serviços de água. (...) Embora grande parte do discurso atual sobre o direito humano à água e ao saneamento diga respeito à sua possível aplicação em países em desenvolvimento, a Irlanda pode servir de lição para os outros países, os paísees desenvolvidos que enfrentam a reforma do sector da água acionada por austeridade, incluindo acordos de privatização dos serviços de água e saneamento.’’

 
Também, no caso português, controvérsias se tem gerado acerca do sistema de cobrança, desde um passado recente, visível a partir do seguinte rol de notícias,

 







Público - ''As decisões de não cobrar a água vão contra a recomendação da ERSAR. “Toda a água consumida deve ser facturada, até porque ao não facturar a consumidores municipais, na prática estamos a dizer que devemos facturar um pouco mais aos restantes consumidores”,
''Muitos operadores responsáveis pela gestão da água, como as câmaras municipais, enfrentam dificuldades financeiras, o que está relacionado, por exemplo, com as situações em que o valor pago pelos utilizadores da água não cobre as despesas''.

Cumpre desde já ressalvar que em matéria de 'Acesso à Água', doravante alvo de análise, se cingirá contudo, a um perspectiva de micro-escala, quer isto dizer não se versará acerca da inacessibilidade que ainda hoje se verifica em grande parte do globo. é apenas numa perspectiva de micro-escala, máxime, os problemas atenientes à cobrança permitindo o acesso a um bem essencial. A este nível, colocam-se, (pelo menos) três categorias de problemas intergeracionais:
i) Problema de qualidade;
ii) Problema de quantidade;
iii) Problema de acesso à água potável;

No que respeita à última das categorias de problemas, procurar-se-á compreender:
I.        O sentido de cobrar pelo acesso a um bem vital;
II.      A controvérsia que gira em toro dos desiguais custos para esse abastecimento;
III.    A consequência na impossibilidade de pagamento;

Serão estes domínios problematizados, no intuito de aprofundar questões de que numa análise superficial conduziriam a respostas erróneas.

 
I. Pagar para aceder a este direito fundamental vital, qual  sentido? É inequívoco que, o acesso à água é vital para a vida humana. Quer na perspetiva da vida individual, quer para o funcionamento da sociedade e de muitas das suas atividades e serviços.
Cabe aos denominados 'serviços de águas' fazer 'a ponte' entre a existência de recursos hídricos ao seu aproveitamento pelas comunidades humanas.
São estes serviços que asseguram, quer o acesso à água -  abastecimento de água para consumo humano, quer a recolha daquela que rejeitam após utilização - drenagem e tratamento das águas residuais urbanas. Pode falar-se de “ciclo urbano da água”.
Aceita-se, pacificamente a essencialidade para a vida humana dos serviços de águas. Visto ser reconhecido pela Organização das Nações Unidas do “direito à água e ao saneamento” como um dos direitos humanos.
No que concerne aos recursos hídricos, os serviços de águas assumem três funções essenciais: instrumentalidade ( de modo a que sejam aproveitados pelas comunidades humanas); garantia ( diga-se institucional), do direito das pessoas de acesso à água, mas também do direito à saúde (vertentes da hidratação e sanitária) e do direito ao ambiente) e, de limitação (limitação no aproveitamento dos recursos hídricos. Ao “canalizarem” quer o acesso, quer a rejeição de águas residuais, os serviços de águas estão a disciplinar a atuação das pessoas nestas matérias).
A função de limitação manifesta-se duplamente, uma vez que, os próprios recursos hídricos são mais protegidos e avistam-se benefícios para as pessoas globalmente consideradas.
Assim, avistam-se duas finalidades (do direito dos recursos hídricos e do direito dos serviços de águas): protecção dos recursos e os sistemas hídricos e salvaguarda dos usos da água pelos seres humanos. Uma visão antropocêntrica do Direito implica que estes dois fins sejam permanentemente ligados e se limitem mutuamente.
Num paralelo com o Princípio do Poluidor-Pagador, neste contexto 'Utilizador-Pagador', funciona como uma espécie de instrumentos de fomento, sob pena de um uso desmesurado, ainda ue involuntário, inconsciente.
No que respeita ao direito dos serviços de águas importa de seguida analisar a organização (institucional) do sector. Ora, são quatro as funções na organização e funcionamento do setor: o planeamento, a regulação, a prestação material do serviço e o respetivo financiamento.
São concebíveis, a propósito destas funções os mais diversos modelos. Uma vez que os serviços de águas não de concentram numa só entidade, pelo contrário configuram-se descentralizados, polarizados afigura-se conveniente compreender a respectiva organização.
A regulação particular dos serviços de abastecimento de água e saneamento de águas residuais, é um assunto com uma grande importância económica e social, uma vez que são serviços essenciais para o desenvolvimento e coesão da sociedade. Por conseguinte, afigura-se necessário compreender a organização do Sector da Água em Portugal.
O domínio da água em Portugal é composto por seis grandes conjuntos de entidades. A Tutela Política (nacional e regional), os Órgãos Consultivos (nacionais e regionais), a Administração Pública da Água (nacional e regional), os Sectores Utilizadores e Entidades Reguladoras (Urbano, Agrícola, Energético e Empreendimentos de Fins Múltiplos), as Estruturas Mistas e Associações e Entidades Não Governamentais.  Sobre os Sectores Utilizadores e Entidades Reguladoras - que aqui interessa -   verificamos quais se inserem neste grupo:

 

Entidades Reguladoras
 
 
Empreendimentos de Fins Múltiplos
 
INAG,I.P
Autoridade Nacional da Água, tem por missão propor, acompanhar e assegurar a execução da política nacional no domínio dos recursos hídricos de forma a assegurar a sua gestão sustentável,  garantir a efectiva aplicação da Lei da Água. Garante a representação internacional do Estado no domínio da água.É igualmente a Autoridade de Segurança de Barragens.
 
EDIA
Empresa de Desenvolvimento e Indra-estruturas do Alqueva, SA., Fornece água e disponibiliza serviços de apoio à decisão do agricultor, com destaque para o SISAP – Sistema de Apoio à Determinação da Aptidão Cultural, que determina a aptidão de um solo para uma cultura pré-selecionada.
 
 
Sector Urbano
 
APDA
Associação Portuguesa de Distribuição e Drenagem de Águas é uma entidade que representa e defende os interesses dos agentes responsáveis pelos sistemas, de abastecimento de água e águas residuais e de todos os demais intervenientes neste domínio. Simultaneamente, esta Associação estimulará o tratamento, investigação e desenvolvimento dos assuntos relacionados com a quantidade e qualidade das águas de abastecimento, drenagem e destino final das águas residuais, constituindo um fórum para profissionais de diversas formações com intervenção no domínio das águas.
 
ERSAR
Entidade Reguladora dos Serviços de Água e Resíduos, As atividades de abastecimento público de água às populações, de saneamento de águas residuais urbanas e de gestão de resíduos sólidos urbanos constituem serviços públicos de caráter estrutural, essenciais ao bem-estar geral, à saúde pública e à segurança coletiva das populações, às atividades económicas e à proteção do ambiente..

 
Não obstacularizando o que foi dito, em tom conclusivo importa, sem delongas salvaguardar que se pode um lado é compreensível a imposição de um pagamento não o é em qualquer medida. Repetindo que se trata de um bem essencial a proibição do excesso ou proporcionalidade lato sensu avoca a limitação e balizamento na fixação dos custos. Neste sentido a Professora Carla Amado Gomes, na já referida conferência fala de números, afirmando que a factura da água não deve representar mais 3% do agregado familiar, pese embora noutros sítios alcance os 0,5%.
A este respeito, a própria entidade reguladora do serviço (ERSAR) vem também recomendando às entidades gestoras que aprovem tarifários que se comportem dentro de determinados limites que consideram precisamente a capacidade contributiva dos consumidores (orçamento familiar) face às demais necessidades “obrigatórias”.

II. Uma das funções que concerne aos Serviços de Águas é a de de financiamento. Podem conceber-se diferentes tipos de instrumentos – tarifas, subsídios, impostos e outros. No final, reconduzir-se-ão a três  diferentes tipos de financiadores: os utilizadores dos serviços ( haverá repercussão integral dos custos da construção das infraestruturas e equipamentos e do funcionamento dos serviços na tarifa paga pelos utilizadores dos serviços); os contribuintes fiscais (os custos dos serviços são suportados, via orçamento estadual ou municipal, pelos impostos pagos pelos contribuintes, sucede quando não exista pagamento pelos utilizadores ou as tarifas não cubram integralmente os custos, obrigando a proceder a transferências do orçamento estadual ou municipal para o sistema de águas) e, os financiadores externos (recurso a fundos disponibilizados por financiadores externos8, como por exemplo os fundos estruturais da União Europeia que têm suportado parte significativa dos custos da construção das infraestruturas de águas em Portugal).
Também ao nível da função de fnanciamento sao concebiveis e existentes soluções diversas quanto à suportação de custos e respectiva distribuição. No caso Português, é patentemente um caso de solução mista, variando de município para município. Tal heterogeneidade ao longo do territ´orio gera as designadas 'Assimetrias Regionais na facturação da água'. A este respeito é inequívoca a verificação, quer na qualidade quer no custo do serviço de abastecimento e saneamento situações díspares.
Neste domínio 'entra em acção' a ERSAR (veja-se a tabela acima). Os poderes que lhe são conferidos cingem-se à emissão de recomendações.
Consequentemente os Portugueses ficam sujeitos a tarifas e condições diferenciadas, situação que não abona face ao Princípio da Igualdade nem tampouco ao Princípio da Proporcionalidade (latu sensu).
Em suma, é ponto assente a elevada disparidade tarifária inter-regional que caracteriza o sistema actual.  Repercussões ou manifestações desta desarmonia culminam num risco da própria sustentabilidade financeira do Grupo de Águas de Portugal, dado que a causa-efeito resulta num evidente aumento de dívidas e progressiva degradação da situação económico-financeira das entidades gestoras.
E, de igual modo compromete a continuação e qualidade do serviço prestado, a realização de investimentos futuros visando aumento do atendimento em falta (particularmente ao nível do saneamento), quer à manutenção e renovação das redes e equipamentos existentes.

III. Tendo em atenção a indispensabilidade do bem em apreço, ainda que seja hipotetizada uma redução do consumo que traduzirá uma diminuição do volume de água é ponto dado adquirido que certas quantidades  são imprescindíveis.
No que respeita ao serviço de abastecimento de água, o reconhecimento pela Assembleia Geral da ONU ao direito fundamental a água potável e saneamento básico, tornou juridicamente vinculativo para todos os Estados-membros, que essa é realização do direito fundamental à saúde e a um nível de vida adequado.
A pedra de toque é a natureza so pagamento. Seguindo a posição adoptada por Dalila Romão, Concluímos, a tarifa ou preço do serviço de abastecimento de água tem a natureza de taxa, receita tributária.
Como ponto de partida temos, então, que a utilização do serviço público de abastecimento de água deve ser remunerada pelos cidadãos que dele usufruam, mediante o pagamento de uma tarifa predeterminada. Estamos aqui perante um duplo princípio de sustentabilidade, não só de natureza económica ou financeira, que procura internalizar custos da prestação do serviço, mas também de sustentabilidade de natureza ambiental, que pode procurar desmotivar os utilizadores de um uso ineficiente ou perdulário do bem essencial que é a água.

Nesse caso o cidadão particular interrogar-se-á 'qual o prazo de prescrição da dívida?'
As dívidas decorrentes do fornecimento dos serviços de águas e resíduos, por se tratar de serviços públicos essenciais, prescrevem no prazo de 6 meses após a sua prestação, ou seja, a entidade gestora deixa de poder exigir o pagamento do preço do serviço prestado assim que decorram mais de 6 meses sobre a data em que o serviço foi efetivamente prestado. Note-se que a entidade que presta o serviço pode exigir o pagamento através da emissão da fatura e, na falta de pagamento voluntário, mediante uma ação judicial com essa finalidade. Contudo, a emissão da fatura não suspende a contagem do prazo de prescrição de 6 meses, o que apenas acontece quando seja dado início à respetiva acção judicial ou se houver, entretanto, reconhecimento da dívida pelo utilizador, nomeadamente através da celebração de um acordo de pagamento faseado.
A prescrição tem de ser expressamente invocada pelo utilizador como fundamento para a recusa de pagamento de dívidas prescritas.
Este regime de prescrição é um regime especial aplicável aos serviços públicos essenciais que afasta a aplicação do prazo geral de prescrição previsto no Código Civil (que é de 5 anos). O facto de o prazo ser de apenas 6 meses tem como objetivo garantir alguma segurança e certeza para os consumidores e levar os prestadores destes serviços a exigir atempadamente o pagamento dos serviços prestados.
Pretende-se, ainda, evitar a acumulação de dívidas que dificultem a gestão do orçamento familiar, tendo em conta que se trata de serviços básicos e essenciais de que não se pode abdicar.
Por outro lado, tendo havido pagamento de uma dívida prescrita não é possível exigir à entidade gestora a respetiva restituição, na medida em que a dívida continua a existir enquanto obrigação natural, apenas tendo deixado de ser exigível judicialmente.

 

§
Conclusões

No que concerne a distinções feitas inicialmente, conclui-se pela necessidade de sedimentar que dentro do conceito (jurídico) lato senso 'Direito à água' é necessário 'separar as águas' pois que, tanto se pode analisar numa perspectiva de direito fundamental como numa perspectiva de recurso hídrico, bem ambiental.
 
A respeito do evocado caso Irlandês e das relatadas notícias, não sendo pretensão aprofundá-los ou esmiuçar cada um em particular (servindo tão só como ponto de partida da escolha do tema a abordar)  cumpre referir quanto ao primeiro que, as questões suscitadas propendem para o príncipios como Proibição do retrocesso social e Principio da segurança jurídica e, por outro lado evocam, na dimensão ambiental questões técnico-jurídicas da introdução deste novo sistema, de estatísticas comparativas de modo a conhecer se ´há alterações comportamentais (benéficas ou prejudiciais) humanas, no consumo de água.
 
Tornou-se pacífica a necessidade de pagamento no acesso à água ainda que, se trate de um bem fundamental vital. Mais se acrescenta, ficaram conhecidas as vantagens de tal pagamento.
 
Segundo o Presidente da AEPSA, Diogo Faria, ''No setor das águas todos os intervenientes devem ter uma função bem definida pois, caso contrário, não se pode construir um sector forte, eficiente e justo. E hoje creio que é consensual que todos os atores têm um papel importante a desempenhar no setor das águas.
Não se pode pensar no setor sem a função legisladora, estratégica, fiscalizadora e reguladora do Estado; Não se pode planear sem os municípios;Não se pode evoluir tecnologicamente sem os privados; Não se pode investir sem a banca;Não se pode atrasar mais o acesso dos serviços à população; E, finalmente, não se podem estabelecer preços sem a conjugação de todas estas variáveis.''

Quanto às disparidades tarifárias inter-regionais, a sua razão de ser é explanada. A alteração do actual sistema urge. Estes serviços devem pautar-se por princípios de universalidade no acesso, de continuidade e qualidade de serviço, e de eficiência e equidade.

Levando em conta a natureza jurídica do pagamento, o 'instituto' vigente em sede de prescrição conforta o particular utilizador. Pese embora, permaneça a preocupação pois, a acumulação de dívidas manifesta-se na degradação da sustentatiblidade económica das entidades gestoras. Situação essa que urge ser invertida e solucionada.

Em suma, torna-se premente que se aja, quer a nível interno, quer a nível internacional, regulando-se no sentido de limitar a liberdade de cada um à utilização da água, dado que tal liberdade terá sempre de ter como limite a liberdade do outro e a necessidade de preservar a qualidade, a quantidade e o abastecimento igualitário da água, universalmente.
Sem a intervenção do Direito, através da criação de normas e fontes jurídicas de cariz internacional e nacional, avizinham-se, num futuro próximo 'conflitos pela água'. Nessa eventualidade há que recear que, uma vez mais, interesses económicos superarem interesses da saúde pública e de qualidade de vida.

 

Bibliografia

Portal da Água inag.pt
http://economico.sapo.pt/noticias/reestruturacao-da-aguas-de-portugal-permite-reducao-de-custos-e-de-tarifas_193307.html
www.ergalonline.com - ''The human right to water and reform of the Irish water sector : Journal of Human Rights and the Environment''
 
CONDESSO, Fernando dos Reis - 'O Direito do Ambiente', Almedina, 2001
 
GOMES CANOTILHO, José e VITAL MOREIRA,   - Constituição da República Portuguesa anotada, Coimbra Editora, 2007
 
OTERO, Paulo e COSTA GONÇALVES, Paulo - Tratado de Direito Administrativo Especial - Vol. II, Almedina, 2009
ICJP - Direito água - Série de Cursos Técnicos 3- [ebook]:

  • AMARARO, António Leitão - ​PERSPETIVAS DE REORGANIZAÇÃO INSTITUCIONAL DOS SERVIÇOS DE ÁGUA
  • GODINHO, Rui - O FUTURO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS DE ÁGUA: O CASO PORTUGUÊS
  • FARIA, Diogo - O FUTURO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS DE ÁGUA
  • OLIVEIRA, Diogo Faria de - O FUTURO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS DE ÁGUA
  • ROMÃO, Dalila - A CONTRAPARTIDA PELO SERVIÇO DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA

Maria Catarina Borges, nº 21445

               

               

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