quarta-feira, 14 de maio de 2014

Contributo para a discussão entre perspectivas antropocêntricas e ecocêntricas. Os motivos lógicos da opção pelo divã antopocêntrico..




“O homem não é mais que a medida de todas as coisas”
Protágoras



Vivemos, nos dias de hoje, numa sociedade de dicotomias. A polarização faz parte de uma vivência colectiva cada vez mais extremada e onde florescem, cada vez com maior vigor, posições absolutamente antagónicas.

            E neste ponto o Direito do Ambiente não é excepção. Temos, numa análise inicial, uma questão prévia relativamente à qual cabe tomar posição, sob pena de incoerência em toda a análise do princípios e diplomas vigente relativos ao Direito do Ambiente: porque deve ser o ambiente protegido? Há duas respostas diametralmente opostas: não deve nunca, o Direito é das e para as pessoas e nestas se deve bastar; deve sempre, numa visão obtusa de defesa intransigente do ambiente per si.

            Qualquer das perspectivas apresentadas parecem-me demasiado simplistas e incapazes de dar resposta por si à questão inicialmente formulada. Mas delas podemos partir para fazer uma primeira abordagem e analise da visão ecocêntrica e antropocêntrica do Direito do Ambiente. Segundo a primeira corrente o Ambiente e a sua tutela e defesa devem ser feitas per si, com autonomia perante o Homem e aquelas que são as suas necessidades. Ao abrigo da segunda corrente a protecção do Ambiente deve ser feita na exacta medida da defesa, actual e futura, da necessidade humana. 

Perante este panorama, seguindo VASCO PEREIRA DA SILVA, há que “rejeitar uma visão negacionista, que desconhece a relevância jurídica autónoma dos fenómenos ambientais quer o fundamentalismo jurídico e ecológico, que tudo reduz à lógica ambiental, sacrificando os demais interesses e valores em jogo.”[1]. É fundamental esta ideia de presente mas também do futuro, como bem resume JORGE MIRANDA, “(…) ao Direito do Ambiente não basta atender a interesses imediatos; tem de se atender igualmente aos interesses das pessoas que hão-de vir, a médio e a longo prazo, porque a Terra é finita e há recursos não renováveis.”[2], com base nesta analise conclui o Professor que “não há, em rigor, um direito a que não se verifique poluição ou ao gozo das paisagens biologicamente equilibradas, reservas e parques naturais (…) Todavia quando radicam em certas e determinadas pessoas ou quando confluem em certos direitos podem reverter em verdadeiros direitos fundamentais.”[3]. O direito ao ambiente, ou a certos direitos concomitantes com este, só se assumem verdadeiramente “legitimados” quando se cruzam com direitos das pessoas. Por si não se apresentam, em qualquer circunstância, como direitos fundamentais constitucionalmente protegidos.  O Pacto Internacional de Direitos Económicos, Sociais e Culturais (PIDESC) vem, também, dar força a perspectiva. “ O PIDESC obriga os Estados a adoptar medidas de «melhoria de todos os aspectos da higiene e do meio ambiente», na medida da obrigação do estado de assegurar o direito das pessoas «ao melhor estado de saúde física e mental possível».”[4]. HENKE vem, definitivamente e de uma forma muito concreta, pôr os pontos nos is afirmando que “o direito que existe independentemente da minha pessoa (…) é, como é óbvio, algo diferente do meu direito e do que eu tenho relativamente a outrem.”[5]

Feito este enquadramento defendo, claramente e consciente das consequências deste raciocínio, que a a dignidade do Direito do Ambiente se afere na justa medida em que este se relaciona com o Homem. Não para o servir numa perspectiva imediatista e egoísta mas sim numa visão ampla de futuro sustentável. A necessidade de defesa do ambiente é óbvia: dele depende a existência da Humanidade tal como a conhecemos, dele depende o futuro das gerações vindouras. Não me parece lógico o raciocínio da defesa do ambiente só por si. Digo, assumidamente, que defender o ambiente (sem prejudicar o crescimento económico e o desenvolvimento social) tem de ser hoje uma prioridade claramente assumida e efectiva dos Estados de Direito modernos e desenvolvidos.

A defesa do ambiente, em todas as suas vertentes, é a defesa do futuro do planeta e da Humanidade. Motivo que legitima a sua dignidade enquanto direito. Motivo, mais do que suficiente, para ser ponto fundamental da agenda politica mundial.


[1] SILVA, Vasco Pereira. “Verde Cor de Direito”, Almedina 2002. Págs.25-26
[2] MIRANDA, Jorge. “Direito do Ambiente”, Edições Instituto Nacional de Administração 1994. Pág.357
[3] MIRANDA, Jorge. “Direito do Ambiente”, Edições Instituto Nacional de Administração 1994. Pág.362
[4] MIRANDA, Jorge. “Direito do Ambiente”, Edições Instituto Nacional de Administração 1994. Pág.362, citando o Pacto Internacional de Direitos Económicos, Sociais e Culturais.
[5] HENKE, Wilhelm. “Das Subjektive Recht im System des oeffentlichen Rechts”, Die oeffentlichen Verwaltung nº17 Agosto de 1980. Pág. 622.



Bibliografia:

- HENKE, Wilhelm. “Das Subjektive Recht im System des oeffentlichen Rechts”, Die oeffentlichen Verwaltung nº17 Agosto de 1980.
- MIRANDA, Jorge. “Direito do Ambiente”, Edições Instituto Nacional de Administração 1994.
- SILVA, Vasco Pereira. “Verde Cor de Direito”, Almedina 2002.
- SOUZA, Mariza Regina. "A Ética Ecológica: discussão entre perspectivas antropocêntricas e ecocêntricas", inédito disponível na biblioteca da Faculdade de Direito de Lisboa 2006.
Pacto Internacional de Direitos Económicos, Sociais e Culturais 
Resolução 37/7 da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas de 28 de Outubro de 1982



Pedro Saraiva
17498, subturma 5

1 comentário: