sexta-feira, 23 de maio de 2014

Intimação para a protecção de Direitos, Liberdades e Garantias

Âmbito de aplicação

Este meio processual, previsto a nível “fundamental” no nº5 do artigo 20º da Constituição Portuguesa, tem origem aí mesmo, mas também do direito internacional a que o nosso Estado se encontra vinculado.

Consubstanciado no artigo 109º do CPTA, é aplicável ao conteúdo da Constituição no seu título II assim como a direitos de estrutura análoga, por imposição do artigo 17º, que prevê que o regime de direitos, liberdades e garantias seja aplicado aos direitos enunciados no Titulo II e aos direitos fundamentais de natureza análoga, pelo que não se vislumbra qualquer fundamento válido para excluir estes direitos de natureza análoga do âmbito do artigo 109º do CPTA.
Como tal, e tendo em conta a natureza análoga do direito ao ambiente, justifica-se plenamente que este seja abrangido pela intimação para protecção dos direitos fundamentais de natureza análoga aos direitos fundamentais.


Dos pressupostos
Passando agora para a questão dos pressupostos podemos afirmar que este meio processual pode ser utilizado quando a emissão de uma decisão de fundo do processo seja indispensável para assegurar o exercício de um direito, liberdade ou garantia, conjugando-se esta indispensabilidade com a impossibilidade ou insuficiência do decretamento de uma providência cautelar no âmbito de uma acção administrativa normal, comum ou especial.

Da legitimidade
No que se refere à legitimidade esta pertencerá naturalmente aos titulares dos direitos, liberdades e garantias.

Do pedido
Já no que consta ao pedido será a condenação à adopção de uma conduta positiva ou negativa por parte da Administração, que pode consistir mesmo na prática de um acto administrativo, ou na abstenção de uma conduta, respectivamente.
O pedido de intimação também pode ser dirigido contra concessionários ou quaisquer particulares, mesmo que não disponham de poderes públicos, não podendo faltar, no entanto, a relação jurídica administrativa, visto estarmos sobre a sua jurisdição.

Da tramitação
A tramitação vem prevista no artigo 110º CPTA, onde este processo é configurado segundo um “modelo polivalente ou de geometria variável", que permite que ele comporte quatro formas processuais distintas, como referido pelo Professor Aroso de Almeida.
Diga-se ainda que a utilização deste meio é tem ainda outra vantagem que se encontra na perspectiva económica, uma vez que não há lugar nestes processos ao pagamento de custas.



Da subsidiariedade da figura

Após lermos o artigo 109º CPTA é clara a natureza subsidiária da intimação, desde logo porque se retira essa subsidiariedade do facto de estar previsto uma intimação urgentíssima provisória, regulada no artigo 131º CPTA, sob a forma de decisão cautelar.

Nesta medida, a intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias não é a via normal de reacção a utilizar em situações de lesão ou ameaça de lesão de direitos, liberdades e garantias, até porque será raro o caso concreto em que se necessite de uma decisão de carácter definitivo, decidida de forma tão rápida.
O meio normal de defesa dos direitos fundamentais são precisamente as acções administrativas comuns ou especiais, eventualmente associadas à dedução de um pedido de decretamento de providências cautelares, por se tratar de uma questão que deve ser acautelada de imediato, esperando-se então pela decisão definitiva do tribunal.

Da urgência
O CPTA, nos artigos já referidos, exige desde logo, como pressuposto do recurso à intimação, a urgência da decisão para evitar a lesão ou inutilização do direito e sem a qual apenas haveria lugar às acções administrativas comuns ou especiais. Mais se exige, que no caso concreto, não seja de facto possível ou suficiente para assegurar o exercício desses direitos recorrer ao decretamento provisório de providência cautelar, segundo o disposto no artigo 131º. Contudo, sempre que seja indispensável, para evitar a lesão de direitos fundamentais, uma decisão de mérito urgente, fica automaticamente excluída a hipótese de recurso à figura prevista no artigo 131º do Código, uma vez que esta norma permite apenas uma “protecção” provisória

No que se refere, ainda, à subsidiariedade inerente a esta figura, questiona-se se a intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias, é apenas subsidiária relativamente às providências cautelares de carácter genérico, segundo o disposto no artigo 131º ou se será ela também subsidiária relativamente a toda e qualquer providência cautelar que vise um direito, liberdade ou garantia? A doutrina assim o tem entendido, justificando que o nexo de subsidiariedade estabelecido entre a intimação e o decretamento provisório de qualquer providência cautelar de natureza genérica abrange também as providências cautelares específicas de protecção de direitos, liberdades e garantias.
A subsidiariedade então prevista no nº1 do artigo 109º trata-se, então de uma subsidiariedade mais ampla, do que a estipulada na própria norma, visto que faz todo o sentido que o recurso à intimação tenha também como pressuposto a inexistência de qualquer outro meio processual para a defesa de direitos, liberdades e garantias.



Concluindo, este meio processual que é a intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias pressupõe que esteja efectivamente em causa a lesão de um direito fundamental, pessoal ou patrimonial, análogo ou não, nos termos do artigo 17º CRP. Como tal, temos que verificar se o direito ao ambiente se enquadra nestas exigências, ou seja, se estamos ou não perante um direito fundamental.
Por exemplo, a Professora Carla Amado Gomes,  não autonomiza o direito ao ambiente, referindo, no seu manual que ao se intentar com sucesso este mecanismo processual do art 109º do CPTA, o autor fica com o direito de exigir da parte contrária, certa conduta, ou a abstenção da mesma, com base no que reclamou. Conclui a professora que, no caso de bens colectivos, como é o ambiente, não há direito a pretensões individuais, mas sim apenas a “interesses de facto de conteúdo subjectivamente indeterminável (em razão da inapropriabilidade de tais bens)”.

Como ponto final podemos afirmar que esta figura processual é de muito rara aplicação, pelo o que a caracteriza e foi anteriormente referido, mas também pelo facto de se tratar de uma mecanismo de excepção, prevendo o CPTA, mais do que figuras processuais para que todos possamos reivindicar os nossos direitos na jurisdição Administrativa. No entanto, é da extrema importância, afirmar também que pode haver tutela do direito ao ambiente, por via desta figura, estando os seus pressupostos preenchidos e sendo a sua subsidiariedade respeitada.

Bibliografia:
Carla Amado Gomes, Introdução ao Direito do Ambiente, AAFDL, 2014
Carla Amado Gomes, Artigo “Pretexto, contexto e texto da intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias”, Lisboa, Março de 2003
Mário Aroso de Almeida, Manual de Processo Administrativo, 2012



Trabalho realizado por António Belair, aluno nº 18021

1 comentário: