Relevância do Procedimento no Quadro do Ambiente
No âmbito do Direito do Ambiente
podemos encontrar uma diversidade de fontes que se traduzem numa diversidade de
disciplinas. A perspetiva tradicional do Direito Internacional Público, numa
visão em que o ambiente é alvo de proteção, a nível internacional, através da
intervenção e cooperação estadual; e a perspetiva global do Direito
Administrativo, com uma dimensão interna, mais recente. Independentemente da
distinção, ambas têm, como fim último, a proteção do ambiente.
Nas últimas décadas tem vindo a
desenvolver-se então um novo Direito Administrativo Global, de natureza diferente
da do Direito Internacional. Este tem uma influência muito mais reduzida nas
questões ambientais, aliás, como refere Carla Amado Gomes, “só muito pontualmente
se fará sentir de forma direta” a sua influência no conteúdo do dever de
proteção do ambiente. Não obstante, as diretivas e regulamentos provenientes do
Direito Comunitário já imporem normas conformadoras das obrigações concretas dos
particulares para com o ambiente. Com base nesta nova realidade, foram
necessariamente surgindo novos sujeitos de direito, particulares e outras
entidades ou instituições, tribunais ou órgãos administrativos especiais e
mecanismos administrativos para a proteção do ambiente. É o caso do
procedimento ambiental.
Hoje, a dimensão procedimental é nova, valorizando não apenas os resultados, mas o modo como a ele se chega. Para além do apoio constitucional de que dispões, é uma questão essencial no quadro do Direito Administrativo do Ambiente.
Mas esta valorização do
procedimento ambiental é um fenómeno moderno. Na lógica tradicional do Direito Público,
a preocupação exclusiva era com a decisão politica. E este, quer fosse um
diploma legislativo ou uma decisão de administração, não o era.
O procedimento tem natureza
diversa, é multifuncional; tem funções legitimadoras, de participação e
organização, comuns a todos, mas que dão origem a procedimentos diversos, com formas
de processo e regras diferentes, pelo que, como afirma Vasco Pereira da Silva,
não faria sentido fazer do processo o paradigma do procedimento, dada esta
diferenciação de características.
Entre os dois principais procedimentos
encontram-se os da função legislativa e os da função administrativa, sendo que
os identificamos portanto consoante a função do Estado que está em causa.
A respeito dos primeiros, haverá
regras que variam consoante a forma do ato legislativo, mas que preveem ainda a
audição de entidades representativas, as ONGAS (estas Organizações Não
Governamentais em matéria de Ambiente podem ter legitimidade legislativa,
quando expressamente previsto) ou de grupos de cidadãos eleitores (previsto na
nossa CRP, artigo 167º). Esta participação legislativa, na lógica de um Estado
de Direito Democrático, afigura-se como um acréscimo, é complementar e
secundária à legitimidade democrática, distinta da da Administração Pública.
Não obstante, a dimensão
procedimental é elevada no âmbito administrativo.
Hoje, assente a grande relevância do procedimento, tendo apoio constitucional, desde logo no artigo 9º, no 267º, nº 5 ou na lei reguladora do procedimento que, apesar de só ter surgido nos anos 90, procura estabelecer um regime procedimental que seja regulador desta nova realidade da administração pública que é, hoje, essencial.
A função administrativa, enquanto
dever-poder exercido pela Administração, em prol da comunidade e na prossecução
dos seus fins e interesses é, cada vez mais, multifacetada. E enquanto realidade
multifacetada, vai desempenhar diversificadas funções. Em primeiro lugar, vai
ser o fator de racionalidade de funcionamento da Administração e das decisões
administrativas. Esta função racionalizadora coincidirá, em parte, com a
organização da administração, e por outro lado com a racionalidade das próprias
decisões e todo o processo envolvente.
Em segundo lugar, o procedimento
servirá também para proceder à definição de interesses públicos concretos, bem
como compô-los com os interesses privados que surgem no âmbito do procedimento.
Visto ser uma área complexa no seio da Administração, é necessário que haja uma
realidade em que há uma ponderação e definição dos vários interesses em causa no
caso concreto: em cada caso haverá uma diversidade de interesses públicos, pelo
que, para além da exigência abstrata da busca do interesse público, há uma
necessidade de encontrar aquele que, concretamente, é o mais importante. O interesse
público que releva é o resultante dessa ponderação, é exigente e requer uma
construção por esta via procedimental. Não obstante, é ainda dada aos
particulares a faculdade de demonstrar que um interesse particular é relevante
e merece ponderação com os outros em causa e proteção. A decisão final tem de
atender a ambos os interesses, quando os haja, e é necessário que a Administração
entenda e respeite essa realidade.
Por fim, vai então exercer
funções de proteção jurídica dos particulares. Os cidadãos têm o direito (constitucionalmente
consagrado como fundamental, como reforça Vasco Pereira da Silva) a ser ouvidos
antes de haver uma efetiva agressão, ou seja, o sentido desta terceira função
será como um mecanismo de proteção preventiva dos cidadãos na luta contra possíveis
e previsíveis ameaças. Não é necessário, nem faria sentido ser, que o lesado já
o seja, que o particular já tenha sofrido o dano. É condição suficiente o dano
eminente, a suspeita fundada de futura agressão.
Bibliografia:
Carla Amado
Gomes, “Risco e Modificação do Acto Autorizativo Concretizador de Deveres de
Protecção do Ambiente”, Dissertação de Doutoramento, Lisboa 2007
Carla Amado Gomes, “Direito Administrativo do Ambiente”,
Mário Aroso de Almeida, “O Novo Regime do Processo nos
Tribunais Administrativos”, Almedina 2007
Vasco Pereira da Silva, “Verde Cor de Direito-Lições
de Direito do Ambiente”, Almedina 2002
http://www.apambiente.pt/index.php?ref=17&subref=146
Maria Inês Pinheiro
Visto.
ResponderEliminar